Para advogado Oto Lima, hierarquia presente na relação com docente, dependendo do modo como for utilizada, pode favorecer a prática do crime, previsto no Código Penal
Uma decisão da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) abriu um precedente que deve nortear novas decisões judiciais. Em julgamento de um caso ocorrido em 2002 no Estado de São Paulo, os ministros concluíram que o crime de assédio sexual, definido no artigo 216-A do Código Penal e geralmente associado à superioridade hierárquica em relações de emprego, pode ser caracterizado no caso de constrangimento cometido por professores contra alunos. No voto, seguido pela maioria, o ministro Rogerio Schietti Cruz destacou que “é preciso considerar a relação de superioridade hierárquica entre professor e aluno, nas hipóteses em que o docente se vale de sua profissão para obter vantagem sexual.
O advogado Oto Lima, sócio-administrador da Lustosa e Lima Sociedade de Advogados, considera acertada a interpretação do STJ e alerta que o envolvimento entre professor e aluno deve ser pautado, cada vez mais, pelo modelo de profissionalismo. Oto pondera que o artigo 216-A do Código Penal traz, entre as hipóteses para caracterizar o assédio sexual, que esse constrangimento deve se dar pelo superior hierárquico. “O entendimento do STJ é no sentido de que a relação entre professor e aluno gera uma hierarquia capaz de atrair a possibilidade de assédio sexual quando o professor se utiliza dela com o objetivo de obter algum proveito ou favorecimento libidinoso em relação a um aluno”, esclarece o advogado.
“Nós sabemos que na prática essa relação entre professor e aluno, em regra, envolve muita admiração; o aluno, de uma forma geral, vê seu mestre com olhos de alguém que ele planeja ser futuramente, tem um espelho na figura do professor. Então, inegavelmente há uma relação de hierarquia que, a depender do modo como for utilizada pelo docente, pode caracterizar crime”, conclui Oto Lima.
Para ele, deve-se buscar, nessa relação, o profissionalismo. “O professor ocupa um mister de importância enorme, porque a educação é o norte que todas as pessoas devem buscar para conseguir lograr êxito na vida, na profissão, na carreira” pontua. “O docente deve utilizar todo o profissionalismo necessário para que essa relação não possa acabar de certo modo descambando para uma situação que possa comprometer tanto a seriedade da relação com o professor como também do ponto de vista dos alunos em detrimento da classe docente. O professor, dentro e fora da sala de aula, deve agir sempre com todos os princípios éticos, de retidão, de probidade com o objetivo de transmitir ao alunado o conhecimento necessário e, ao mesmo tempo, servir de exemplo para os alunos”, propõe.
O caso
Segundo o processo, o réu, em 2012, ao conversar com uma aluna adolescente em sala de aula sobre suas notas, teria afirmado que ela precisava de dois pontos para alcançar a média necessária e teria tocado em suas partes íntimas. Em primeira instância, ele foi condenado a um ano e quatro meses de detenção mais multa. A sanção foi substituída por pena restritiva de direitos. A defesa apelou e o TJ-SP deu parcial provimento ao recurso para reduzir, de um terço para um sexto, a fração de aumento pela majorante aplicada em virtude de a vítima ser menor de 18 anos. Com isso, a pena final foi estabelecida em um ano e dois meses de detenção.
No recurso ao STJ, o professor alegou que não foi comprovada a intenção de constrangimento com fins de obter vantagem ou favorecimento sexual e que a aluna nem precisava dos pontos para aprovação na matéria. Afirmou, ainda, que o crime de assédio sexual não poderia ser considerado no caso, pois não havia relação hierárquica com a suposta vítima.
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